terça-feira, 30 de junho de 2020

9. Transição Musical no Brasil do Século XIX Para o Século XX

Demolição do Morro do Castelo para a construção da avenida Central, Rio de Janeiro, 1904
Nesse período podemos perceber duas maneiras distintas de “civilizar” a música popular no Brasil. A primeira foi por meio do emprego de temas, melodias ou ritmos de origem popular em obras românticas, como já ocorria na Europa. No Antigo Continente esse fenômeno servia às ideologias nacionalistas, trazendo uma reapresentação da música popular mais tradicional, de forma mais “civilizada” ou culta. O mesmo ocorreu no Brasil.
Villa-Lobos - Bachianas Brasileiras: https://www.youtube.com/watch?v=EqCj0gkbBMs
Villa-Lobos em 1922
 

A segunda maneira foi a apresentação das danças populares, transformadas em danças de salão com harmonia, formas e instrumentação vindas da Europa. Essa esteve mais próxima das classes médias do período.

Dança da Corte, Palácio de Queluz/Portugal: https://www.youtube.com/watch?v=jhmaKXBAhs4&t=8s
Os músicos desse período, principalmente os de camadas mais baixas, mulatos e negros, precisavam se enquadrar em padrões aceitos pela elite, que, por sua vez, tentava “civilizar”, ou seja, “europeizar” os músicos e seus produtos. Assim, muitos músicos, socialmente reprimidos pela elites, passaram a apresentar ritmos, danças e canções tradicionais, de forma mais “civilizada”.
Essa tentativa de “civilizar” a música popular no país vinha desde o fim do século XIX. Grande parte da cultura “popular”, como danças, músicas, festas e costumes, possuía origem africana e era desprezada pela elite formada pelas famílias de fazendeiros ou comerciantes enriquecidos, igreja e pela pequena classe média emergente. Para as elites urbanas as manifestações da cultura popular eram vistas como símbolo do atraso e se dedicavam a reprimi-las.

Dança trazida ao Brasil pelos negros africanos. De tão sensual, o Lundu acabou sendo proibido pela Corte. Mas, como qualquer manifestação da cultura popular, não deixou de ser dançado mesmo às escondidas. Nesse contexto repressivo, somam-se estratégias, muitas vezes violentas, como a retirada das pessoas mais pobres dos centros urbanos e seu deslocamento para as periferias: https://www.youtube.com/watch?v=yTNHxwWnUI4

Antes da Reforma Pereira Passos (1902 a 1906), Rio de Janeiro era conhecido como "Porto Sujo" e "cidade da morte".
Esse deslocamento de pessoas, do centro para as periferias, acabou favorecendo o desenvolvimento de práticas artísticas populares, uma vez que, na periferia, a repressão era muito menor do que no centro das cidades. Mas, mesmo assim, as manifestações musicais populares eram malvistas e muitas vezes consideradas obscenas e indecentes pela elite, que, desse modo, circunscrevia o choro, o maxixe, o samba, o batuque, o lundu, o fandango etc para os arredores das cidades.
Batuque - Johann Moritz Rugendas, 1822-1825.
 

Surgiram nessa época nomes como Chiquinha Gonzaga e Joaquim Callado.
A repressão às músicas populares, porém, não acabou com elas. Ao contrário, como a “limpeza” dos centros urbanos acabou promovendo a multiplicação das práticas artísticas populares nas periferias, isso fez com que a música popular crescesse e começasse a exercer maior pressão sobre a cultura elitizada, que exigia sua “disciplina” nas cidades. A música popular começou a se infiltrar nos centros urbanos, porém, de maneira seletiva e disciplinada, limitando-se aos espaços reservados pela elite. Esse movimento propiciou uma apropriação da cultura popular por parte da elite, que passou a olhá-la com menos desprezo, chegando até a valorizar elementos da música popular.
Quanto à música erudita, no final do século XIX, o romantismo era a escola mais forte e seu grande nome era Carlos Gomes que trazia claras influências da cultura brasileira em suas obras. E até a Semana de Arte Moderna, em 1922, que representa a eclosão do movimento nacionalista, a música erudita foi se apropriando de maneira progressiva de elementos da cultura brasileira.
Não devemos esquecer, porém, que, nesse movimento de apropriação, o folclore nacional era revestido de trajes europeus, especialmente francês e alemão.
A NACIONALIZAÇÃO!
Com o destaque alcançado pela música de Carlos Gomes, o mundo cultural passou a prestar mais atenção ao que poderia constituir uma música genuinamente brasileira. Neste aspecto o rico folclore nacional foi o material que estimulou os compositores a utilizar estes temas para elaborações eruditas, embora ainda seguidoras, em linhas gerais, de escolas estrangeiras. Basílio Itiberê da Cunha foi um dos precursores desta corrente, com sua rapsódia para piano A Sertaneja, escrita entre 1866 e 1869.
Brasílio Itiberê - A Sertaneja: https://www.youtube.com/watch?v=BaslJMaMXkA
Outros nomes importantes são Luciano Gallet e Alexandre Levy, de escola europeia, mas que de maneiras diferentes buscaram incorporar elementos tipicamente nacionais em sua produção. O caminho estava aberto, e um sabor definitivamente brasileiro pode ser encontrado na obra de Francisco Braga e especialmente na obra de Alberto Nepomuceno. Este empregou largamente ritmos e melodias do folclore em uma síntese inovadora e efetiva com as estruturas formais de matriz europeia.
Francisco Braga é o compositor do Hino à bandeira, com letra de Olavo Bilac.
O Garatuja, comédia lírica em três atos, baseada na obra homônima de José de Alencar, é considerada a primeira ópera verdadeiramente brasileira no tocante à música, ambientação e utilização da língua portuguesa, com ritmos populares como o maxixe e a habanera.
Alberto Nepomuceno (1864 - 1920) - O Garatuja (1904): https://www.youtube.com/watch?v=GcJPOLfdGhU
No princípio do século XX, a realização do concerto de violão do compositor popular Catulo da Paixão Cearense, no Instituto Nacional de Música, promovido por Nepomuceno, causou grande revolta nos críticos mais ortodoxos. Ainda como incentivador dos talentos nacionais, atuou para editar as obras de um controvertido compositor que surgia na época: Heitor Villa-Lobos. 
O HINO NACIONAL BRASILEIRO
Violoncelista e compositor consagrado, Francisco Manuel da Silva (1795/1865) compôs em 1823 um hino em comemoração à Proclamação da Independência do Brasil. Admirador da “Marselhesa”, ele achava que um hino vibrante e triunfal, como o seu, era mais adequado à celebração do acontecimento do que o composto por Dom Pedro I, belo também, mas, incapaz de motivar o entusiasmo do povo.
Pouco divulgada, a composição só seria relembrada em abril de 1831, ao ser cantada pela multidão que festejava a abdicação de Pedro I, passando a ser conhecida, com letra de Ovídio Saraiva, como “Hino 7 de Abril”.
Dez anos depois, bem orquestrado, o hino seria executado nos festejos da Coroação de Dom Pedro II, ganhando a denominação de “Hino da Coroação”. Então, embora não oficializado, mas já consagrado pela tradição como nosso Hino Nacional, foi em 1869 tema de uma peça magistral, a “Fantasia Sobre o Hino Brasileiro”, composta e tocada num sarau no Paço pelo célebre pianista-compositor norte-americano Louis Moreau Gottschalck.
Proclamada a República, logo os mais radicais desejaram a feitura de um novo hino pátrio, considerando o antigo herança do Império. Daí a realização em janeiro de 1890 de um concurso para a sua escolha que teve a participação de 29 concorrentes. Só que o chefe do governo, marechal Deodoro da Fonseca, decidiu em boa hora que ao vencedor caberia apenas o título de “Hino da Proclamação da República”. Isso em razão dos apelos de vários políticos que pediam em nome do povo a manutenção do velho hino.
Assim, realizado o concurso, foi assinado o Decreto n° 171, de 20.01.1890, que conservava o “Hino Nacional” e adotava o “Hino da Proclamação da República”, ou seja, respectivamente, o de Francisco Manuel da Silva e o de Leopoldo Miguez e José Joaquim Medeiros e Albuquerque.
O Brasil passava então a ter o seu hino oficializado, porém, de forma incompleta pois faltava-lhe a letra. Tal situação permaneceria ignorada até julho de 1909, quando o governo instituiu um novo concurso “para escolha de uma composição poética a se adaptar com todo o rigor à melodia do Hino Nacional”. Ganhadora, uma poesia de Joaquim Osório Duque Estrada (1870/1927) ainda esperaria vários anos para afinal ser declarada oficialmente a letra do “Hino Nacional Brasileiro”, pelo Decreto n°15.671, de 06.09.1922, véspera do Centenário da Independência e 99 anos depois da criação da composição. E, por falar em datas, Francisco Manuel morreu cinco anos antes do nascimento de seu parceiro Osório Duque Estrada.
Texto encontrado no sítio Musicabrasilis em 11/05/2020: https://musicabrasilis.org.br/temas/uma-breve-historia-do-hino-nacional-brasileiro
 
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
VERMES, Mônica. Alberto Nepomuceno e o Exercício Profissional da Música. In: Música em Perspectiva, V. 3, N. 1. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2010. p. 7-32 Disponível em: http://revistas.ufpr.br/musica/article/view/20978/28619

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