terça-feira, 30 de junho de 2020

10. Romantismo e Modernismo

Nas últimas décadas do século XIX, as danças, festas e costumes “populares” eram desprezados pela elite, que viam essas manifestações como símbolos do atraso.As classes dominantes interessavam-se em urbanização, tecnologia e nas máquinas, ou seja, em modernidade e progresso. Por isso, olhavam admiradas para a Europa, vendo-a como o modelo a ser seguido. Assim, no período conhecido como “Belle époque brasileira”, que compreende desde a proclamação da República, até a Primeira Grande Guerra Mundial, os conceitos de música popular e de música culta separaram-se, ocorrendo a importação de música “culta” europeia (principalmente do romantismo francês e alemão) e a incorporação seletiva e disciplinada da cultura popular nos meios urbanos.
No Brasil, o movimento romântico manifestou-se após 40 anos de seu início na Europa, ligado à elite,concentrando-se nas cidades de Rio de Janeiro e São Paulo. Os compositores viajavam para a Europa para conhecer o estilo ou para aprimorar seu conhecimento sobre ele. Sem essa viagem, o músico era considerado despreparado,portador de limitações técnicas e sociais para a atuação musical junto à elite.
Na década de 1860, já existiam ideais de “nacionalização” da música no Brasil, mas não havia uma proposta estética definida, não se tratava de uma tendência nacionalista, e sim de uma manifestação patriótica através da inserção de elementos de temática nacional nas composições. A ideia era inserir referências poéticas ou musicais ao Brasil em composições que seguiam o padrão estético europeu. Essa tendência estimulou a composição de óperas em português e com temática brasileira. Essa temática também era encontrada nos hinos patrióticos, acadêmicos, triunfais ou de guerra escritos durante essa década. Na música instrumental, porém, podemos encontrara inserção desses elementos em temas musicais de origem reconhecidamente brasileira. Nela destaca-se o nome de Carlos Gomes.
A Cayumba (1857) – Carlos Gomes
Apesar do olhar preconceituoso sobre muitos dos compositores deste período, deve-se ressaltar que o o movimento musical nacionalista só se organizou de maneira efetiva ao final da década de 1920, embora o sentimento patriótico e nacionalista já estivesse presente na produção dos românticos desde o século XIX. Além disso, a sociedade brasileira do início do século XX sofria forte influência europeizada Europa, sob os mais diversos aspectos, inclusive o musical, sendo relativamente “natural” a busca de referências europeias.
“Trovas Alegre”, “Dolor Supremus” e “Cantigas” de Alberto Nepomuceno

O romantismo no Brasil com características nacionalistas, tal como o programa político do final do século XIX, visava contribuir para a consolidação da independência do Brasil,construindo, para isso, uma imagem cosmopolita, e mais distante de Portugal,apesar de tomar como exemplos outros países europeus. Foi, portanto, um movimento que buscava uma identidade nacional, fazendo uso de elementos nativos, sem se afastar do Velho Continente. O distanciamento musical de cunho nacionalista ganhou contornos mais firmes somente com o surgimento do Modernismo, que tem como marco inicial a Semana de Arte Moderna em 1922, temas que serão abordados em nossa próxima aula.
As tendências modernistas na música chegaram ao Brasil de maneira bastante gradual. No início do século XX, jovens músicos brasileiros discutiam e polemizavam sobre a estética musical, aproximando-se de uma proposta modernista ao retratar em suas reflexões a dinâmica social das camadas populares. Músicos como Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Villa-Lobos, por exemplo, buscavam em suas obras uma mistura com a cultura popular brasileira, principalmente a africana, vista como elemento nacionalista e original.
Esses músicos voltavam-se para a música popular em busca de uma representação do Brasil. Esse processo enriqueceu a música erudita e influenciou a poesia modernista brasileira,constituindo uma ponte entre essas duas manifestações artísticas.
A música modernista no Brasil influenciou e foi influenciada pela música europeia, que passava por um processo de transformação intensa, principalmente quanto à estrutura harmônica.As discussões no país foram bastante influenciadas pelo politonalismo francês,sobretudo de Darius Milhaud, com a proposta da sobreposição de tonalidades na música. Villa-Lobos utilizou em suas obras elementos mais próximos do estilo de Debussy, Bartók e Stravinsky, que afetam a estrutura harmônica e primam por elementos estranhos, violentos, estridentes e fortes.
Em busca da valorização do país,Villa-Lobos fez uso de elementos da cultura popular, mas não como um elemento exótico como fizeram antes outros compositores, e sim como parte da composição.Podemos notar essa preocupação pelo título de algumas de suas peças: Danças africanas (1914),Amazônia (1917), Lenda do caboclo (1920),entre outras.
A presença de europeus, como a passagem de Dariu Milhaud pelo Rio de Janeiro em 1917-1918, contribuiu para uma atmosfera modernista musical no país, ampliando seu conceito e repertório, além de dar relevância a compositores nacionais que utilizavam tangos brasileiros em axixes, como Ernesto Nazareth e Marcelo Tupinambá. É importante ressaltar que esses ritmos não eram bem aceitos pelas elites intelectuais da época.
Heitor Villa-lobos – Uirapuru - 1917
O início do século XX foi bastante turbulento no país sob os mais diversos aspectos: mudanças artísticas e sociais, crescimento urbano crescente, em especial o da periferia e da população negra. Essas mudanças foram fundamentais para o estabelecimento de uma identidade cultural urbana, que se reflete na música do período. Desde os músicos do romantismo brasileiro, já havia a tentativa de construir uma identidade nacional, com base na inserção de elementos “exóticos” nacionais. O nacionalismo ganhou força com o modernismo, com características já presentes antes da Semana da Arte Moderna. Organizou-se como movimento a partir desta, sobretudo com o diálogo entre a música erudita, a música popular e a literatura. Foi nesse contexto que as propostas modernistas se fortaleceram.Podemos dizer que, a partir daí, observa-se a formação de uma arte genuinamente brasileira, tanto erudita quanto popular, estabelecendo padrões próprios com base no diálogo entre as diferentes artes.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Enciclopédia da música brasileira: popular, erudita e folclórica. Reimpressão da 2a. ed. SãoPaulo: Publifolha, s.d. (Disponível em: https://play.google.com/store/books/details/Andr%C3%A9_Diniz_Almanaque_do_choro?id=1GcE9Cz9QC4C)
TINHORÃO, J. R. História Social da Música Popular Brasileira. São Paulo: Ed. 34, 1998.

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