A primeira apresentação pública e oficial do rádio no Brasil foi em 1922, na Exposição Nacional em comemoração ao Centenário da Independência do Brasil. Prática comum na época, as exposições nacionais eram eventos de projeção internacional,servindo como uma vitrina onde os países participantes exibiam novidades tecnológicas, entre outras coisas. A Exposição Nacional de 1922 era fundamental para o país, uma oportunidade de se mostrar próspero, saudável, desenvolvido e,principalmente, moderno aos olhares europeus.
A empresa norte-americana Westinghouse trouxe uma estação transmissora, montada no alto do Corcovado, e instalou aparelhos para a recepção das transmissões nos pavilhões da Exposição,assim como nas cidades de São Paulo, Petrópolis e Niterói. No dia da abertura da Exposição Nacional, transmitiram o discurso de Epitácio Pessoa, Presidente da República, e a ópera Il Guarany de Carlos Gomes, executada no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, encantando o público.
Antena da Westinghouse no
Corcovado
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Cenas das celebrações do Centenário da Independência do Brasil em 1922, incluindo inspeção de navios da marinha norteamericana e britânica pelo presidente Epitácio Pessoa e desfiles militares no Rio de Janeiro: https://www.youtube.com/watch?v=bS_ga-gGsSY&list=PLZ9oDq8nKRs8y8gbYS973t8f9h1tmlzth&index=4
Com o sucesso e a repercussão das primeiras transmissões radiofônicas no país, no ano seguinte Roquette Pinto e Henrique Morize fundaram a primeira emissora de rádio nacional. A ideia era de que a emissora fosse utilizada apenas para fins culturais e educativos, como algumas rádios que estavam surgindo em alguns países da Europa. Assim, em 1923,foi fundada a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.
Edgar Roquette
Pinto, o pai da radiodifusão no Brasil, acreditava no poder educativo do rádio.
“Comunicar para Educar”
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O setor radiofônico desenvolveu-se lentamente no país, devido aos altos custos de investimento necessários, e em 1930 o país contava com apenas 16 emissoras, número pequeno quando se consideram as dimensões territoriais do país. Além disso, o preço do aparelho receptor, o rádio de galena, também era bastante elevado. Eram aparelhos de escuta individual, através de um fone de ouvido, caríssimos para a maioria dos brasileiros, e que, além de tudo, sofriam com a captação das transmissões, que eram de baixa potência e exigiam a construção de antenas externas.
Com as melhorias técnicas constantes e rápidas, na década de 1920 a indústria criou mecanismos para a adaptação de alto-falantes, como os utilizados em gramofones, a aparelhos receptores de rádio. Desse modo, a escuta deixou de ser individual e passou a ser coletiva,acabando com os rádios de galena e alterando para sempre a experiência de ouvir rádio.
Trecho da radionovela O direito de nascer (Rádio Nacional - Anos 1950): https://www.youtube.com/watch?v=xUjfFY4BgwY
Nos primeiros anos do rádio no Brasil, a programação das emissoras era composta de músicas clássicas, óperas,entrevistas de estúdio, leitura e comentários das notícias publicadas nos jornais da época, e da apresentação de artistas. Os artistas e os entrevistados normalmente apresentavam-se gratuitamente, sem cachê. Durante a década de 1920,o rádio era o espaço que propiciava aos artistas reconhecimento e maior público para suas apresentações.
Em 1927, com a entrada no Brasil do sistema elétrico de registros sonoros, que trouxe novas condições de produção e reprodução, os intérpretes desenvolveram novos estilos de canto popular, alguns distanciando-se do canto tradicional de traços operísticos das décadas anteriores. Francisco Alves, Mário Reis, Aracy Cortes, Orlando Silva, entre outros, transformaram-se em ídolos do público. Além disso, o processo de gravação evoluiu muito, possibilitando novas formações instrumentais e até mesmo a gravação de grandes orquestras. Assim, arranjadores como Pixinguinha e Radamés Gnatalli puderam criar estilos próprios de orquestração.
Francisco de Morais Alves, o rei da voz.
Graças a ele compositores como Cartola, Heitor dos
Prazeres ou Ismael Silva vieram a ser consagrados, o mesmo
ocorrendo com várias canções que interpretou
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Nessa mesma época, o rádio se expandiu, tornando-se o principal meio de divulgação de música popular. As emissoras ampliavam suas instalações, permitindo receber um público cada vez mais numeroso. O mercado fonográfico brasileiro tornou-se atraente para empresas estrangeiras e até o final da Segunda Guerra a produção foi controlada por três grandes empresas: a Odeon (antiga Casa Edison), a RCA Victor, e a Columbia.
Disco compacto de vinil pela RCA Victor
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Sob o governo de Getúlio Vargas, a partir de 1930, foi construída a base para a Era de Ouro do Rádio no Brasil,que durou até 1950, quando surgiu o primeiro canal de televisão no país. Em 1936 foi fundada a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, a primeira a ter alcance em quase todo o território nacional.
Vingança - Linda batista: https://www.youtube.com/watch?v=YTyRs8krw9s&list=PLfDBT-bO1-Oum2tcvOFV_315xCGZoQDTz
Noel Rosa - Último desejo (Aracy de Almeida): https://www.youtube.com/watch?v=zddl6gX8veY&list=PLfDBT-bO1-Oum2tcvOFV_315xCGZoQDTz&index=2
Vargas percebeu as potencialidades do rádio,e as via com bastante interesse. Assim, regulamentou o setor de maneira que o governo tivesse um controle maior sobre o rádio, mas isentou dos ouvintes as taxas cobradas para o registro da instalação de receptores em residências e permitiu a veiculação de anúncios comerciais, que fortaleceram as bases econômicas das emissoras, um grande avanço no setor.
Um dos programas mais antigos do rádio brasileiro, aqui em sua edição completa de 1978: https://www.youtube.com/watch?v=Q_PjfGSj9A8
Durante o regime varguista, a música foi classificada pelo governo como importante no processo formador da cultura nacional e existiu a preocupação de escolher um gênero que representasse o brasileiro. Assim, o samba apareceu como representante do ritmo nacional. Porém, a figura do malandro e boêmio, altamente relacionada ao samba e aos sambistas, não era bem vista pelo regime ditatorial varguista, que adotou medidas de pressão contra eles. Assim, para receber o registro de muitos sambas e a autorização de sua veiculação nas emissoras de rádio, os sambistas foram obrigados a se adaptar. Com modificações nas letras, muito do caráter periférico e regional do samba foi deixado de lado, e este passou a ser mais consumido pelas elites da sociedade.
SAIA DO CAMINHO. Samba Canção da Era de Ouro - Aracy de Almeida: https://www.youtube.com/watch?v=YkmE5AC1-JU&list=PLzITkXyxBOGtaFCuc1lBWND6W7p9aiej-
O samba deixou seus redutos étnicos de origem e passou a circular por espaços da classe média carioca. Compositores como Noel Rosa, Custódio Mesquita, Ary Barroso, entre outros, serviram como mediadores culturais, promovendo essa circulação. Assim, através do rádio e do disco, o samba projetou-se no mercado nacional. Com esse processo, perdeu um pouco de sua rusticidade, tornando-se mais refinado e intelectualizado. Desse modo, o preconceito anterior de intelectuais e elites diminuiu. O gênero, antes visto como símbolo étnico, passou a ser considerado símbolo nacional fundamental para a identidade cultural brasileira.
Com a massificação do rádio, as elites reagiram, adotando alguns procedimentos de controle para diferenciar o comportamento adequado e inadequado do público. Além de os frequentadores das emissoras não serem vistos com bons olhos, paredes de vidro passaram a separar o palco da plateia, houve maior policiamento, cobrança de ingressos, entre outras medidas. Com a chegada do primeiro canal de televisão no Brasil, um aparelho acessível apenas para as camadas mais abastadas, com programação considerada de bom gosto e intelectualizada, esta passou a ser uma alternativa para as elites e a classe média brasileiras.
Jackson do Pandeiro e Almira
Castilho apresentam-se na Rádio Nacional, um dos pilares da Era do Rádio no
Brasil.
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Assim, aprofundou-se a segmentação do mercado fonográfico, que trouxe uma linha mais popular e de massas, com gêneros como o bolero, a guarânia, o tango, a música sertaneja, o baião, e as marchinhas carnavalescas. Destacam-se nesse período intérpretes como Emilinha Borba, Marlene, Dalva de Oliveira, Anísio Silva, Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto, Luiz Gonzaga, e duplas como Cascatinha e Inhana.
Em 1946, foi gravado o samba-canção Copacabana,de João de Barro e Alberto Ribeiro, que agradou uma nova boemia intelectualizada, frequentadora de bares e casas noturnas da zona sul do Rio de Janeiro. Intérpretes e compositores como Nora Ney, Antônio Maria, Lúcio Alves, Dóris Monteiro, entre outros, estavam ligados a esse segmento, que acabou originando a Bossa Nova.
1952 - Nora Ney - Ninguém me Ama (Samba Canção): https://www.youtube.com/watch?v=-jpgKBbNmN0
Nora Ney |
GRANDES VOZES BRASILEIRAS:
Quero destacar aqui as seguintes vozes de ouro do Brasil:
O Cantor das Multidões. A Voz Orgulho do Brasil. O Caboclinho Querido. Nas décadas de 40 e 50, assim eram chamados Orlando Silva (1915-1978), Vicente Celestino (1894-1968) e Silvio Caldas (1908-1998), respectivamente.
Rei da Voz era o codinome de Francisco Alves (1898-1952) e Nelson Gonçalves (1919-1998) completa esta lista dos grandes cantores brasileiros.
Francisco Alves - Cinco letras que choram (Adeus) (1952): https://www.youtube.com/watch?v=zXt-f6X2hbg
MODA DA PINGA MARVADA PINGA INEZITA BARROSO (1953):
* Essa lista é muito pequena, diante da constelação de estrelas brasileiras
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ANDRADE, M. Ensaio sobre a música brasileira. São Paulo, Martins, 1965.
MARIZ, V. História da Música no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
NEVES, José Maria. Música contemporânea brasileira. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2008.
SEVERIANO, J. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. Editora 34, 2006
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