Modinha:
Um gênero de música em especial assumiu um lugar de destaque nos séculos XVIII e XIX: a modinha. Derivada da palavra “Mote” (motivo), logo adotou o termo “Moda” e seu diminutivo “Modinha”. Originariamente portuguesa, provavelmente surgida nas elites governantes no Brasil colônia a partir de elementos da ópera italiana e foi citada pela primeira vez na literatura em 1779, por Nicolau Tolentino de Almeida na “Sátira Oferecida ao Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Dom Martinho de Almeida”, embora seja ainda mais antiga.
Em Portugal, segundo o autor Mozart de Araújo, os termos “ária, romance e moda” serviram, em meados do século XVIII, para designar genericamente os Ayres, Tonos, Tonadilhas, Coplas, Seguidilhas e especialmente as Serranilhas, Rimances, Soláus e Xácaras, todas formas de canções de períodos anteriores. Desta variedade é natural que a Modinha tenha assumido formas musicais e poéticas variadas no início.
Domingos Caldas Barbosa, foi um sacerdote, poeta e músico brasileiro, autor e divulgador de lundus e Modinhas em Portugal, um dos estilos musicais pioneiros da música popular brasileira. Foi membro da Nova Arcádia de Lisboa. É considerado o primeiro nome importante da música popular Brasileira (MPB) e de grande relevância na história da música popular portuguesa.
A modinha é, em linhas gerais, uma canção suave, romântica e chorosa, de feição bastante simplificada, muitas vezes de estrutura estrófica e acompanhamento reduzido a uma simples viola ou guitarra (antecedente da guitarra portuguesa), embora haja exemplos de modinhas do século XVIII com acompanhamento de baixo contínuo e cravo, sendo de apelo direto às pessoas comuns. Presente constantemente nos saraus da aristocracia, podendo ser mais elaborada e acompanhada por flautas e outros instrumentos e ter textos de poetas importantes como Tomás Antonio Gonzaga, cuja obra Marília de Dirceu foi musicada uma infinidade de vezes. A modinha, como canção elitista, era tão apreciada que também músicos da corte compuseram algumas peças no gênero, como Marcos Portugal, autor de uma série com letras extraídas da obra de Gonzaga, citada acima, e o Padre José Maurício Nunes Garcia, autor da célebre "Beijo a mão que me condena".
Marcos Portugal (1762-1830) e Tomás Antonio Gonzaga (1744-1810) Já, já me vai Marília
branquejando Os Mares minha bela : https://www.youtube.com/watch?v=dF8MJbp12JE
Tomás Antonio Gonzaga |
Enquanto a modinha, como gênero musical, empolgava os salões da corte de D. Maria I, nas ruas de Lisboa o ritmo dominante era a “Fofa”, dança de origem brasileira, que embora não tenha persistido na sua terra de origem, foi recebida e divulgada em Portugal a ponto de se tornar, segundo relatos de viajantes, a “dança mais característica de Portugal”.
Os Me Deixas Que Tu Dás (anônimo, atribuído a Domingos Caldas Barbosa , 1738/40?-1800): https://www.youtube.com/watch?v=5qP9K3-3fJA&list=PLNczFWFjs6tHjlrOUbKxrJPsmgSrFHDfR
Algumas características da Modinha:
1. Uso poético de temas como ciúmes, dores da despedida e amores desprezados;
2. Ausência da Negra ou Mulata, substituída pela musa branca e senhorial. A morena é o padrão romântico da musa brasileira;
3. Sensualidade dos temas;
4. Linha clássica das melodias;
5. Acompanhamento com baixo d’alberti, arpejado;
6. Uso de redondilhas menores, frases curtas em versos de 4 ou 7 sílabas;
7. Preferência por modo menor;
8. Compassos quaternários ou binários;
9. Ritmo anacrúsico ou acéfalo;
10. Uso da Dominante com sétima;
11. Acompanhamento de viola ou guitarra;
12. Letra despretenciosa;
13. Abundância de ornamentos melódicos.
Lundu:
A chegada do lundu (Londu, Landu, Lundum, Londum, Landum) ao Brasil se deu através dos negros de Angola, mas por duas vias: passando por Portugal ou diretamente da Angola para o Brasil. Em Portugal agregou o uso dos instrumentos de corda, mas acabou proibido pelo rei, Dom Manuel por ser contrário aos bons costumes. Já a vinda direta de Angola para o Brasil recuperou o acento jocoso, mordaz e sensual que incomodara a sociedade lisbonense. Aparece no Brasil no século XVIII como uma dança sem canto e de natureza licenciosa, para os padrões da época. Nos finais do século XVIII, presente tanto no Brasil como em Portugal, o lundu evolui como uma forma de canção urbana, acompanhada de versos, na maior parte das vezes de cunho humorístico e lascivo, tornando-se uma popular dança de salão.
A notícia mais antiga do lundu-canção é encontrada na coletânea de versos musicados por Domingos Caldas Barbosa, intitulada “Viola de Lereno”, sendo o primeiro volume publicado em 1798. Até então, o lundu era referenciado somente como uma forma de dança de origem africana e ritmo sincopado. Durante todo o século XIX, o lundu é uma forma musical dominante, e o primeiro ritmo africano a ser aceito pelos brancos. Seus versos satíricos, maliciosos, cantando amores condenados, muitas vezes não eram assinados pelos autores que, com medo de perseguições, preferiam o anonimato. Mas outros compositores assumiam suas obras, certamente mais brandas e adequadas ao gosto da classe dominante, como Francisco Manuel da Silva, que compôs o Lundu Da Marrequinha.
Lundu, Anônimo, século XIX. Colhida por Mário de Andrade: https://www.youtube.com/watch?v=XH2XkZUM7BM
Capa da partitura de lundu, de Francisco Libânio Colás, séc. XIX |
Apesar da influência do ritmo negro africano, a síncopa, muito mais clara e sistematizada no lundu que na modinha, é utilizada principalmente nas vozes cantadas, mantendo predominantemente o acompanhamento de viola arpejado e com ritmo constante de semicolcheias.
Algumas características do Lundu no século XVIII:
1. Aceitação pessoal ou indireta do Negro;
2. Temas humorísticos, impregnados de ironia e mordacidade;
3. Pouco respeito aos valores da sociedade patriarcal;
4. Crítica velada ao papel de submissão exigido pela sociedade;
5. Sensualidade;
6. Louva a Negra e a Mulata;
7. Influência da percussão do batuque;
8. Compassos dos primeiros lundus: 3/8 e 6/8;
9. Uso da sincopa;
10. Acorde de sétima da Dominante;
11. Acompanhamento preferencialmente realizado por instrumentos de cordas dedilhadas.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
OLIVEIRA, Olga M. F. A Modinha e o Lundu no Período Colonial. In: A Música no Brasil Colonial (Coord: Rui V. Nery). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. p. 330-362
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