As origens do termo “samba” ainda não foram esclarecidas, mas a explicação mais provável é que ela seja proveniente da palavra angolana “semba”, que significa “umbigada”, um traço coreográfico presente no batuque e no lundu (dança e canto de origem angolana)de negros e mulatos, desde as últimas décadas do século XVIII .. Desde o final do período colonial o samba já estava presente no país. Contudo só começou a se difundir amplamente no final do Segundo Reinado, com as concentrações de negros e pobres na periferia carioca.
Era uma dança exclusiva das classes baixas, negros e mulatos oriundos dos morros, favelas e da periferia do Rio de Janeiro. Uma manifestação oposta à cultura da elite. Tal como o choro, o samba em seu início não apresenta definições tão claras, uma vez que incorporava uma série de expressões de origem africana, influenciadas por contribuições portuguesas.
Pelo Telefone - Donga: https://www.youtube.com/watch?v=X99_DMzHPNg
Ernesto Joaquim Maria dos Santos -
Donga
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Na estrutura dos primeiros sambas era comum a alternância de um verso ou estrofe cantada (muitas vezes de maneira improvisada) por um solista, seguida por um refrão dos demais participantes, ou seja, um refrão coral, uma estrutura de origem africana. Os samba corridos não apresentavam refrão. Além da estrutura outro elemento que fazia parte do samba primitivo era a umbigada. Uma disputa entre os participantes das rodas de samba pela melhor dança e pelo melhor improviso de versos, acompanhados por instrumentos de percussão ou apenas por palmas ou batuques em objetos (o uso de objetos de cozinha era bastante comum, originando a expressão “cozinha” para a seção de percussão de grupos populares).
O samba primitivo consistia em uma roda de pessoas que batucavam enquanto na parte interna do círculo dançavam um homem e uma mulher, que se alternavam entre os outros participantes. Era uma espécie de dança cantada de roda improvisada.
É Batucada (1933) - composição: Caninha / Visconde de Bicoíba.
Nos últimos anos do século XIX, principalmente após a Abolição, muitos negros se deslocaram do interior para os grandes centros urbanos .No início do século XX, o samba começou a passar por um processo de adaptação, durante o qual samba do morro tornou-se o samba urbano. Assim como aconteceu com o maxixe, o samba foi perdendo o caráter de dança em roda improvisada, adaptando-se para se tornar uma dança de pares nos salões ou uma dança de blocos nos bailes de carnaval. Seu canto também se transformou, adequando-se aos padrões exigidos nos salões de dança e de chorões, que requeriam maior variedade harmônica e melódica, além do uso de um instrumental cada vez mais diversificado, similar ao das “orquestras típicas” da década de 1920.
Além disso, se antes o samba baseava-se em versos improvisados alternados por um refrão coral, o samba urbano exigia também uma introdução e uma segunda ou até uma terceira parte, tal como ocorria em tangos, valsas e polcas.
Pelo telefone (1917) - composição: Donga e Mauro Almeida. Primeira gravação de um samba.
De acordo com alguns estudiosos do gênero, essa primeira fase de “urbanização” do samba ocorreu entre 1917, ano em que foi gravado o samba Pelo telefone de Donga, até 1930. Depois dessa primeira fase, o samba continuou seu processo evolutivo, apresentando uma visão bem-humorada do cotidiano da classe média e a exaltação nacionalista do Brasil. Do ponto de vista musical, o samba ganhou diversas espécies de manifestações a partir da década de 1920.
Samba de fato (1932), composição: Pixinguinha / Baiano
13.1 Conflitos Sociais do Samba
O samba, atualmente considerado a principal expressão tipicamente brasileira na música,desenvolveu-se no Rio de Janeiro ao longo do século XX. Como vimos na aula passada, o samba carioca tem inúmeras variantes, mas o produzido até 1930 é bastante diferente dos posteriores.
No início do século XX, o samba estava ligado principalmente a comunidades de negros e mestiços emigrados da Bahia e de outros estados do Nordeste, que se instalaram, no Rio de Janeiro, em bairros próximos ao cais do porto, como a Saúde, a Praça Onze e a Cidade Nova. Nesses bairros, havia demanda por trabalho braçal e, portanto, possibilidade de emprego. Assim, festas, danças e tradições musicais foram retomadas por essas pessoas, incentivadas principalmente pelas mulheres. A maioria delas vendia doces na rua e tinha ligações com o candomblé,tornando-se as grandes responsáveis pela preservação dos festejos africanos.Entre elas, estavam tia Amélia (mãe de Donga), tia Prisciliana (mãe de João de Baiana), tia Mônica (mãe de Pendengo e Carmen da Xibuca) e, a mais conhecida,tia Ciata. Foi na casa desta última, na Cidade Nova, que o samba adquiriu forma, tornando-se quase que simultaneamente um gênero musical do morro e da cidade.
Hilária Batista de Almeida – Tia Ciata
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Os negros trouxeram, portanto, muitas tradições de sua terra natal, inclusive suas festas de “sambas”, palavra que também usavam para designar a modalidade musical coreográfica que consistia em formar uma roda, em cujo centro alguém começava a dançar e, dançando, escolhia um parceiro do sexo oposto com uma umbigada. O samba como dança e festa coletiva acontecia não apenas nos quintais, mas também tomava ruas e desfilava na forma de cordões. Como música e composição, porém, deu seus primeiros passos na casa de tia Ciata, preservando os estribilhos, cantados e dançados em ambos os lugares. Era lá que se reuniam bons ritmistas, compositores e verdadeiros mestres da música popular, como Sinhô, Pixinguinha, Donga, Caninha, Heitor dos Prazeres, entre outros.
Entre os sambistas havia uma divisão em dois grupos. O primeiro era formado pelos nascidos nas últimas décadas do século XIX, que circulavam em rodas de samba da Saúde e da Cidade Nova. Eram frequentadores dos candomblés, das festas das baianas famosas e da comunidade festeira da região. Esse grupo incluía grandes nomes, como Baiano, Caninha, Pixinguinha, Donga, Sinhô, entre outros,que praticavam um samba amaxixado, próximo do choro, com sua base musical centrada nos instrumentos de corda e sopro, e um pandeiro, além das palmas.
Manuel Pedro dos Santos - Baiano
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Caboclo do Mato (1937) – João da Baiana,Pixinguinha e Janir Martins
O outro grupo era identificado pelo “padrão Estácio”, de características mais pesadas, com instrumentos de percussão que executavam uma estrutura rítmica bastante particular, bastante próxima do que encontramos atualmente. Era formado por nascidos principalmente no século XX, como Marçal, Paulo da Portela, Baiaco,Ismael Silva, entre outros. A divisão não é meramente etária, mas sim de identidades.
Até a década de 1920 os dois grupos estavam claramente divididos,embora se cruzassem em eventos como a festa da Penha, desfiles de cordões ou blocos da Praça Onze, nos botequins da zona do meretrício da Lapa etc.
Assim,de um lado tínhamos o Estácio, do outro, a Cidade Nova, e em cada um desses lados um padrão musical e um conjunto diferenciado de valores. Entre eles, uma disputa: o que é o verdadeiro samba? Foi só a partir de 1917, com a gravação de Pelo telefone, que o samba apareceu como gênero musical propriamente dito, e foi com ele que essa discussão ganhou força, gerando diversos atritos entre os sambistas. Além disso, o ano de 1917 foi fundamental para a música popular brasileira, já que Pelo telefone é considerado o primeiro samba oficialmente registrado no Brasil, e foi sucesso absoluto no carnaval daquele ano, servindo de fundo musical para todos os desfiles de clubes carnavalescos ocorridos na Avenida Central.
Devemos ressaltar que o samba não nasceu nos morros, mas foi deslocado para lá à medida que as classes mais baixas foram “empurradas” da região central da cidade para as favelas, devido ao processo de reurbanização decorrente da invasão da classe média nos antigos redutos das comunidades de negros e pobres.
O samba muitas vezes é tratado como um elemento da cultura popular, que veio das camadas mais baixas e depois foi aceito e reconhecido pelas classes mais altas. Na verdade, isso não passa de uma ilusão, uma vez que o samba não foi construído apenas por negros e pobres. Seu processo evolutivo foi influenciado também por membros da classe média e da elite, muitas vezes interessados em forjar uma identidade brasileira. O samba é, portanto, o resultado de uma relação de negociação entre as classes dominantes e as classes baixas, unidas pelo interesse em criar uma identidade brasileira comum. Para compreender melhor como o samba se situa nessa relação, temos de levar em conta o contexto.
Ismael Silva
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Num primeiro momento, o samba não foi aceito pelas elites e seu ritmo foi muitas vezes repudiado e ridicularizado. Num segundo momento, ele passou a ser aceito, despertando o interesse de intelectuais e sendo tocado nos redutos da elite. Num depoimento ainda na época da ditadura, Donga afirmou que os sambistas eram perseguidos pela polícia e que ser sambista na década de 1960 era quase equivalente a ser comunista. Essa perseguição foi resultado do processo histórico que modificou o espaço geográfico da cidade para adequá-lo aos moldes ditados pela burguesia, tendo como ideais a modernização europeia, afim de “civilizar” o Rio. Os sambistas foram expulsos das áreas centrais entre 1900 e 1930 e seus redutos foram substituídos por grandes avenidas. A reforma urbana de Pereira Passos a partir de 1903 foi de grande impacto para essa situação.
Além disso, para “civilizar” a capital, era preciso reprimir certas práticas sociais e culturais dos trabalhadores, consideradas imorais e bárbaras pelas autoridades, que classificavam os pobres como “classes perigosas”. Também era necessário adequar os trabalhadores às novas relações de trabalho, uma vez que este possuía uma carga negativa proveniente dos tempos da escravidão. Para construir uma nova ideologia do trabalho, não bastou apenas redefinir seu conceito, mas foi preciso recorrer também à repressão e à perseguição. Para uma sociedade que passou a colocar o trabalho como valor supremo, sinônimo de ordem e civilidade, a presença de “vagabundos” era perigosa, pois a ociosidade levaria essas pessoas ao crime e aos vícios que as camadas mais altas queriam eliminar. Com isso, muitos trabalhadores da região do porto, vendedores ambulantes, entre outros que não possuíam horário de trabalho regular, ou trabalho fixo, foram levados para as prisões por serem considerados”vagabundos”. Muito sambistas passaram por essa situação.
Morro da Previdência: Primeira favela e
reduto do Samba Carioca
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No entanto, havia trocas culturais entre essas classes, ou seja, alguns indivíduos da classe dominante, policiais e autoridades tinham interesse no samba, e muitas vezes davam proteção aos sambistas, como ocorreu com a casa de tia Ciata, protegida por policiais, devido a contatos particulares de seu marido com a polícia. Um caso que demonstra bem isso é o de João da Baiana,quando foi preso e teve seu pandeiro apreendido numa festa da Penha, sendo impedido de comparecer a um compromisso com o senador Pinheiro Machado,admirador do samba. Ao saber da situação, o senador considerou-a absurda e assinou o pandeiro de João da Baiana, que passou a ser então utilizado como proteção contra as prisões.
SAMBA-ROCK
Samba-rock é um tipo de dança que surgiu da criatividade dos frequentadores dos bailes - em casas de família e salões da periferia de São Paulo - no final da década de 1950 e começo da década de 1960, mesclando os movimentos do rockabilly com o gingado brasileiro de se dançar samba . Nasceu ao som dos primeiros DJs e, depois, das equipes de som.
A forma de se dançar samba-rock foi sendo aprimorada com os festivais de dança, onde os dançarinos disputavam entre si para ver quem era o melhor. As disputas entre os dançarinos de samba-rock seguiam os mesmo moldes do filme "Embalos de Sábado à Noite", onde havia o júri técnico formado por aqueles que se julgavam ser os melhores dançarinos da época.
É também um gênero musical, embora isso ainda suscite algumas discussões. Na primeira metade da década de 1970, esse tipo de música foi chamado por diversos nomes: sambalanço, swing, rock samba e, finalmente, samba-rock. Em 1978, foi lançada a primeira coletânea contendo músicas tocadas nos bailes de samba-rock. Ela se chamava "Samba Rock - o Som dos Blacks" e deu início a uma nova era.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ALBIN, R. C. A. O livro de ouro da MPB. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003.
ANDRADE, M. Ensaio sobre a música brasileira. São Paulo, Martins, 1965.
MARIZ, V. História da Música no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
NEVES, José Maria. Música contemporânea brasileira. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2008.
SEVERIANO, J. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. Editora 34, 2006
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